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Judiciário deve evitar retroalimentar estigma ao aplicar monitoração eletrônica, diz Rosa Weber
22 DE JUNHO DE 2023
A utilização da monitoração eletrônica, pela Justiça Criminal, de maneira criteriosa, para evitar a retroalimentação de estigmas, da violência estrutural e do próprio sistema carcerário, foi ressaltada pela presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, nesta quarta-feira (21/6). Ao inaugurar a Conferência Internacional sobre Monitoração Eletrônica: Tecnologia, Ética e Garantia de Direitos, ela enfatizou que essa medida não deixa de ser um mecanismo de restrição da liberdade individual, ainda que sem o encarceramento intramuros.
“A monitoração eletrônica não tolhe da pessoa monitorada, assim como a prisão não retira da pessoa em situação de prisão, todos os demais direitos e condição de cidadania que não os exclusivamente atingidos pela restrição individual e contínua que a medida enseja”, defendeu.
A conferência internacional acontece no CNJ até sexta-feira (23/6), como atividade do Programa Fazendo Justiça, iniciativa desenvolvida em parceria com o Programa Nacional das Nações Unidas (PNUD) e o apoio do Ministério da Justiça e da Segurança Pública (MJSP), entre outros apoiadores institucionais. O evento debate o papel das novas tecnologias diante da monitoração eletrônica, a seletividade penal e racial projetada diante desses aparatos e a proteção social necessária, entre outros aspectos.
A presidente do CNJ e do STF afirmou que, bem como a prisão, a monitoração eletrônica não deve ser tratada como regra. “Axiologicamente, são e serão, sempre, medidas de exceção. Sua aplicação pelo Poder Judiciário, portanto, deve ser criteriosa e considerar as condicionalidades do sujeito, bem com a possibilidade da aplicação de alternativas penais menos gravosas”, disse.
O secretário nacional de Políticas Penais, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Rafael Velasco, manifestou a preocupação de que 11 estados brasileiros não tenham profissionais, como psicólogos e pedagogos, para o acompanhamento dos presos e presas que cumprem penas alternativas. “É uma economia das piores possíveis”, lamentou, acrescentando que o Ministério irá auxiliar todos os estados para que tenham equipes multidisciplinares que possam promover a ressocialização.
Ele participou da abertura do evento juntamente com a representante do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no Brasil, Katyna Argueta. Ela reforçou que o respeito aos direitos humanos de detentos e detentas é um indicador chave de desenvolvimento das sociedades e que a responsabilidade do sistema penal está, não somente na aplicação da pena, mas na aplicação de condições para reinserção dessas pessoas na sociedade.
Katyna destacou que a monitoração eletrônica tem papel importante neste ciclo, ao proporcionar uma forma menos invasiva de controle e possibilitar aos apenados manterem o vínculo com as suas famílias, mas ressalvou que, em país desigual, como o Brasil, é importante que a implementação da monitoração eletrônica leve em conta cada caso e suas vulnerabilidades.
Aspectos éticos e sociais
O conselheiro do CNJ e supervisor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ), Mauro Martins, defendeu que a monitoração eletrônica seja utilizada com responsabilidade e parcimônia. Ele presidiu a mesa da Conferência Magna, composta pelo professor da Universidade de Regina, no Canadá, James Gacek, e pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Rogerio Schietti, também mestre e doutor em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo (USP).
Mauro Martins informou que o CNJ, por meio do Programa Fazendo Justiça, tem realizado uma série de ações para a capacitação dos atores e para a qualificação das políticas públicas que incidem do início ao fim do ciclo penal, desde a porta de entrada, com as audiências de custódia, até as ações de promoção da cidadania daqueles que deixam o sistema prisional.
“E aqui se insere a monitoração eletrônica, importante instrumento que ainda carece de maior estruturação e qualificação no Brasil para que possa cumprir seus objetivos e não se tornar instrumento de perpetuação da punição, estigmatização e retroalimentação dos espaços de privação de liberdade”, disse. Ele citou a relevância da Resolução CNJ 412/2021, que estabeleceu diretrizes e procedimentos para a aplicação e o acompanhamento da monitoração eletrônica de pessoas.
O conselheiro também destacou a necessidade de garantir a proteção de dados das pessoas monitoradas. “Os dados coletados devem ser tratados com o máximo de segurança e respeito à privacidade. É imperativo estabelecer medidas eficazes para evitar o uso indevido ou a divulgação não autorizada dessas informações sensíveis”, afirmou.
O professor da Universidade de Regina, James Gacek, traçou um panorama das tendências mundiais de uso da monitoração eletrônica, inclusive com o uso de inteligência artificial, e falou sobre aspectos éticos de utilização desses equipamentos.
Segundo ele, o monitoramento eletrônico é uma alternativa ao encarceramento, utilizado em 12 países para tratar a questão da marginalização e da pobreza, além de outros problemas sociais. “Consideramos que essas soluções têm que ser humanas para os problemas humanos”, defendeu. Neste sentido, a aplicação da monitoração eletrônica deve levantar questões, como o impacto do monitoramento sobre a vida de quem a utiliza. “Temos que buscar alternativas para o encarceramento e trazer sanções penais mais atenuadas”, frisou.
Ao final da conferência, o ministro do STJ Rogerio Schietti pontuou o avanço representado pelo uso da monitoração eletrônica pela Justiça Criminal, mas também advertiu para o risco da naturalização de práticas ineficazes.
“O grande desafio tem sido instrumentalizar as Justiças estadual e federal com esta tecnologia. A alegação é de falta de recurso para custear os equipamentos e também de recursos humanos, não só para aplicação da tecnologia, mas para supervisão do equipamento”.
Ele relatou que, no Brasil, a operacionalização do uso do equipamento de monitoração é mais comumente realizada “de forma improvisada” por policiais penais ou oficiais de justiça, de maneira pouco criteriosa. “Isso significa, em última análise, não só desprestígio dessa medida, como também total ineficácia do procedimento”.
Texto: Mariana Mainenti
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias
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