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Artigo – Condomínio sem convenção: o que fazer? – por Thyago Garcia
19 DE JUNHO DE 2023
Quais as consequências jurídicas de um condomínio que não possui uma convenção condominial? A simples aprovação de um regimento interno tem força vinculante entre todos os moradores?
1. QUAIS AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DE UM CONDOMÍNIO QUE NÃO POSSUI UMA CONVENÇÃO CONDOMINIAL?
1.1. Um condomínio sem uma convenção condominial enfrenta uma série de consequências jurídicas que podem afetar tanto os direitos e obrigações dos proprietários das unidades quanto o funcionamento geral do condomínio. A convenção condominial é um documento fundamental que estabelece as regras, direitos e deveres dos condôminos, além de regulamentar a administração e gestão do condomínio.
1.2. Sem a convenção condominial, os condôminos podem enfrentar incertezas e disputas em relação a vários aspectos, tais como:
• Regras e restrições: A convenção condominial geralmente estabelece as regras de convivência, como horários de silêncio, normas de utilização das áreas comuns e restrições quanto a animais de estimação, entre outras. Sem essa regulamentação, os condôminos podem encontrar dificuldades em resolver conflitos e estabelecer um ambiente harmonioso.
• Direitos e deveres dos condôminos: A convenção condominial determina os direitos e deveres dos condôminos, como o dever de contribuir com as despesas condominiais, o direito de participar das assembleias e o direito de usufruir das áreas comuns. Sem a convenção, pode haver falta de clareza e uniformidade na aplicação dessas obrigações e direitos.
• Administração do condomínio: A convenção condominial também trata da forma de administração do condomínio, estabelecendo a criação de uma assembleia geral de condôminos, a eleição de síndico e conselho fiscal, bem como as regras para prestação de contas e tomada de decisões. A ausência de uma convenção adequada pode gerar conflitos e dificuldades na gestão do condomínio.
• Uso das áreas comuns e privativas: A convenção condominial costuma definir o uso das áreas comuns, como piscina, academia, salão de festas, entre outros, assim como regras sobre reformas e alterações nas unidades privativas. A falta de uma convenção pode levar a divergências sobre o uso dessas áreas e ações que afetem a estrutura do condomínio.
1.3. Além dessas questões, a ausência de uma convenção condominial pode dificultar a aplicação de penalidades em casos de descumprimento de normas ou inadimplência, bem como a resolução de disputas entre os condôminos.
1.4. Dessa forma, podemos concluir que a ausência de uma convenção implica na ausência da existência legal do condomínio. Assim, os moradores dessas espécies de condomínio precisam contar com uma convivência harmônica para conseguirem decidir sobre medidas importantes para o condomínio.
1.5. No Brasil, para que um condomínio seja considerado o que se chama “condomínio de direito” – e, portanto, que sujeita todos os seus condôminos a uma série de direitos e obrigações -, a única saída é a elaboração de uma convenção condominial.
1.6. E para a elaboração da convenção existe um único caminho: seguir o que preceitua o artigo 1333 do Código Civil (“A convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre elas tenham posse ou detenção”).
1.7. Neste aspecto, tão logo que aprovada a convenção, o condomínio edilício passa a existir internamente entre seus condôminos produzindo efeitos inter partes. A única ressalva que se faz é: para que a condomínio exista regularmente (e possa ser chamado de condomínio de direito) a convenção precisa ser registrada no Cartório de Registo de Imóveis.
1.8. A falta de registro torna o condomínio existente de fato, porém, não regular. Todavia, existe entendimento jurisprudencial que essa circunstância não retira, por exemplo, a legitimidade do condomínio em pleitear o recebimento das cotas condominiais dos seus condôminos, vejamos:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – CONDOMÍNIO DE FATO – LEGITIMIDADE ATIVA – SERVIÇOS DISPONIBILIZADOS – TAXAS CONDOMINIAIS – ANUÊNCIA DOS CONDÔMINOS – ENCARGOS DEVIDOS. A circunstância de o condomínio autor não ser regular, sendo sua existência somente de fato, não retira sua legitimidade para pleitear o recebimento de taxas condominiais. A finalidade do Registro da Convenção de Condomínio é conferir-lhe validade perante terceiros, não constituindo requisito inter partes. (…).” (TJ-MG – AC: 10245140103244001 MG, Relator: Rogério Medeiros, Data de Julgamento: 13/07/2017, Câmaras Cíveis/13ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 21/07/2017).
1.9. Esse entendimento, inclusive, já foi pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, resultando na súmula n. 260: “A convenção de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é eficaz para regular as relações entre condôminos.”
2. A SIMPLES APROVAÇÃO DE UM REGIMENTO INTERNO TEM FORÇA VINCULANTE ENTRE OS CONDÔMINOS? QUAL A EXTENSÃO DA EVENTUAL APROVAÇÃO DESSE MERO REGIMENTO?
2.1. Primeiro devemos partir da premissa que um condomínio sem convenção é um mero condomínio de fato. A doutrina e jurisprudência dominante equiparam essas espécies de condomínio a uma espécie de associação.
2.2. Como tal, a jurisprudência majoritária dos tribunais tem concluído que a simples aprovação de um regimento interno – sem convenção – possui caráter vinculante apenas entre aqueles condôminos que participaram e/ou anuíram com tal espécie de associação.
2.3. Nesse sentido, podemos trazer à baila as seguintes jurisprudências para esclarecer o tema:
“COBRANÇA – CONTRIBUIÇÃO DE TAXAS DE MANUTENÇÃO – CONDOMÍNIO DE FATO – ASSOCIAÇÃO – NÃO ASSOCIADO OU QUE A ELA NÃO ANUIU – IMPOSSIBILIDADE – AÇÃO IMPROCEDENTE – FUNDAMENTOS DA SENTENÇA QUE DÃO SUSTENTAÇÃO ÀS RAZÕES DE DECIDIR – APLICAÇÃO DO ARTIGO 252 DO REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO – PRECEDENTES DO EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO.” (TJ-SP – AC: 10215714020148260577 SP 1021571-40.2014.8.26.0577, Relator: Erickson Gavazza Marques, Data de Julgamento: 07/10/2020, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/10/2020)
“RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA – ART. 543- C DO CPC – ASSOCIAÇÃO DE MORADORES – CONDOMÍNIO DE FATO – COBRANÇA DE TAXA DE MANUTENÇÃO DE NÃO ASSOCIADO OU QUE A ELA NÃO ANUIU – IMPOSSIBILIDADE. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese: ‘As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram’. 2. No caso concreto, recurso especial provido para julgar improcedente a ação de cobrança. ” (REsp 1280871/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/Acórdão Ministro MARCO BUZZI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 11/03/2015, DJe 22/05/2015).
2.4. Sendo assim, caso os representantes de um condomínio (sem convenção) pretendam discutir e aprovar um Regimento Interno com uma série de regras de convivência, é certo que tais normas terão efeito apenas entre aqueles que participarem da assembleia de deliberação e aprovação, sendo impossível estender os efeitos das regras ali impostas a eventuais moradores que não participarem da assembleia.
2.5. Uma ressalva importante relacionada a condomínios sem convenção diz respeito à cobrança das cotas condominiais. Alguns entendimentos jurisprudenciais afirmam que é possível cobrar as cotas, mesmo na ausência de uma convenção, desde que seja demonstrado que o condômino, em algum momento, tenha concordado com essa cobrança ou tenha obtido algum benefício em relação a ela.
2.6. Essa abordagem leva em consideração situações em que o condômino tenha agido de forma a indicar sua anuência com a cobrança das cotas, mesmo sem a existência de uma convenção condominial. Isso pode ocorrer, por exemplo, quando o condômino tenha expressamente aceitado pagar as cotas ou quando tenha se beneficiado das despesas condominiais, usufruindo de áreas comuns ou serviços disponibilizados pelo condomínio.
2.7. No entanto, é importante ressaltar que esse entendimento não é unânime e pode variar de acordo com o tribunal e a jurisdição em que o condomínio está situado. A falta de uma convenção condominial pode gerar incertezas e disputas quanto à obrigatoriedade da cobrança das cotas condominiais.
2.8. É recomendado que, diante de um condomínio sem convenção, os condôminos busquem orientação jurídica especializada para entender a legislação local e os entendimentos dos tribunais em sua região. Dessa forma, poderão tomar decisões informadas e buscar a regularização da situação, seja por meio da elaboração de uma convenção condominial ou pela adoção de medidas legais apropriadas para garantir a cobrança das cotas condominiais, quando cabível.
Thyago Garcia é advogado, Sócio-Fundador do escritório “Garcia Advogados”, Diretor da OAB/PG, pós-graduado em Direito do Trabalho e em Processo Civil pela Universidade Católica de Santos/UniSantos.
Fonte: Migalhas
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