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Proteção da infância nas plataformas digitais: Webinar discute papel da Justiça
04 DE MAIO DE 2023
O papel do sistema de Justiça do Brasil ante a exposição de crianças e adolescentes em conteúdos veiculados por meio da internet, e a dificuldade para fazer valer as normas de proteção a esse público estão sob discussão. Participantes do webinar “Trabalho Infantil Artístico e o Mundo Digital” concordaram, na abertura do evento, que há fundamentação jurídica suficiente para atuação preventiva e impeditiva, mas destacam a importância de as próprias plataformas digitais exercerem função seletiva e restritiva. O evento começou na manhã desta quinta-feira (4/5) e seguirá até a manhã da sexta-feira (5/5).
“Temos um gigantesco desafio a enfrentar, porque a forma como a internet e, em especial, as mídias sociais vêm sendo utilizadas, acabou por transformar cada uma das crianças e dos adolescentes com acesso à rede em potenciais provedores de conteúdo digital”, afirmou o conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Richard Pae Kim, que também é presidente do Fórum Nacional da Infância e da Juventude (Foninj). “Há um conflito: liberdade de expressão de um lado e, de outro, a proteção prioritária e integral e a proibição do trabalho antes da idade mínima”, destacou o magistrado, que alertou para os potenciais efeitos danosos do excesso de exposição pública no desenvolvimento das pessoas, inclusive com risco à saúde física.
O webinar reúne 22 palestrantes e é uma iniciativa conjunta do CNJ, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), do Ministério Público do Trabalho (MPT) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O objetivo é debater como seria possível proteger as crianças e os adolescentes de problemas oriundos do trabalho infantil na internet, valendo-se da Constituição Federal e da legislação hoje existentes.
Plataformas digitais
A necessidade de as plataformas digitais se comprometerem com o conteúdo veiculado fez-se presente nos discursos de dois participantes da abertura do webinar. “Fica evidente a necessidade dessas empresas exercerem a sua responsabilidade social e observarem o ordenamento jurídico de cada local”, avaliou a procuradora do Trabalho responsável pela Coordenadoria Nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção dos Direitos das Crianças e Adolescentes (Coordinfância), Ana Maria Villa Real Ferreira Ramos. “Não basta respeitar (as leis), é preciso lutar para que os outros também respeitem”, afirmou o representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Rogério Magnus Varela Gonçalves.
Com a internet e a massificação do poder de veiculação de conteúdo, antes restrito às empresas de comunicação, as pessoas ficaram sujeitas a efeitos negativos que demandam adaptação do poder público para a proteção do indivíduo e a efetividade da legislação. A memorização de roteiros, a preocupação com o número de inscritos e com a monetização de posts para o denominado digital influencer passaram a fazer parte do cotidiano de meninos e meninas, moças e moços. Por sua vez, pais e mães assumiram as funções de gestores de contratos e dos consequentes ganhos financeiros conquistados em troca de likes, muitas vezes por meio de publicidade disfarçada como trabalho artístico.
“Temos um princípio constitucional de proteção integral da criança e do adolescente que diz tudo em relação à proteção da infância e que não é respeitado pelas plataformas digitais do Brasil”, comentou a procuradora Ana Maria ao se referir ao artigo n. 227 da Constituição. “Pais e mães que exploram a imagem dos filhos para obter vantagens econômicas violam a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Marco Legal da Criança e do Adolescente e a Lei Henry Borel”, explicou o conselheiro do CNMP. “Mas ainda é possível recrutar crianças residentes nos mais variados rincões desse País, para produzirem, dentro dos seus próprios lares, peças de campanhas, muitas vezes, lamentavelmente, dirigidas de forma abusiva a outras crianças, para promover produtos inadequados à sua idade.”
Respeito
Como exemplo da atuação de crianças na internet, Morgana Secco apresentou sua experiência com a filha Alice, que completará 4 anos de idade na próxima semana. A garota mora em Londres com os pais brasileiros e a irmã, uma bebê de colo, e ganhou fama com os conteúdos que a mãe começou a veicular na internet, em redes sociais. Como fala português, a pequena, falante e articulada, atraiu a atenção de agências de publicidade e ganhou espaço em propagandas de veiculação multimídia. Morgana contou que ela e o marido, graças aos ganhos com a produção de conteúdo e a participação da filha em campanhas, podem se dedicar exclusivamente ao convívio com suas duas meninas. Ao manifestar ciência dos riscos quanto à superexposição nas redes sociais, a mãe diz ser rigorosa com os limites que impõe.
“Escolho as situações que vou compartilhar e evito postar imagens em que elas estão vulneráveis, muito íntimas”, explicou Morgana. “Penso sempre que, se é uma situação que possa ser motivo de vergonha no futuro, evito postar e acredito que, no momento que faço esse filtro de uma maneira rigorosa, reduzo muito os riscos”. A mãe contou que também tem o cuidado de nunca divulgar endereços ou nome de escola, nem faz postagens on-line para evitar informar em tempo real sobre a localização da família. Contudo, apesar de todos os cuidados, a rotina do núcleo familiar já sofreu perturbações por causa do uso da imagem de Alice em memes. “O uso da imagem de qualquer pessoa deveria ser só mediante autorização”, reclamou.
No fim de 2022, uma campanha publicitária com a imagem de Alice rendeu destaque a um banco e fez a imagem da garota circular sem controle. Isso obrigou a mãe a uma rotina de registro de queixas. “As plataformas digitais têm sistemas de denúncias de direito de imagem e de direito autoral, mas isso é muito difícil de ser acessado por uma pessoa, ainda mais quando o volume é grande”, disse. “Demora de até dois dias para o bloqueio do conteúdo, depende de denúncia de post por post, preenchimento de formulário, umas plataformas oferecem o recurso, outras não têm e, em algumas, é chato registrar uma denúncia.”
Texto: Luiz Cláudio Cicci
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias
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