NOTÍCIAS
Justiça Restaurativa: Judiciário aplica método em caso de subtração internacional de crianças
31 DE JANEIRO DE 2023
Apontado como autor de violência doméstica no Paraguai, Fábio* não aceitou que sua ex-mulher, brasileira, levasse as filhas embora após a separação e denunciou a mãe das meninas por sequestro internacional de criança. O caso chegou ao Centro de Justiça Restaurativa da Seção Judiciária do Paraná (Cejure/PR), que colocou frente a frente uma mãe brasileira, um pai paraguaio e duas crianças, além de autoridades dos dois países. O conflito familiar transnacional contou com a abordagem da Justiça Restaurativa para ajudar a solucionar o problema.
A União chegou a determinar ação de busca, apreensão e restituição das crianças com base na Convenção de Haia para que as meninas voltassem ao Paraguai, local de residência antes da separação do casal. Mas a Defensoria Pública da União (DPU) atuou para tratar o caso, que envolveu ruptura de núcleo familiar e denúncia de violência doméstica. Foram mais de 16 encontros virtuais até que o acordo estabelecendo as épocas de visitas e de férias fosse firmado em dezembro.
A Justiça Restaurativa se orienta pela escuta de ofensores e vítimas com objetivo de contribuir para a responsabilização e reconstrução do tecido social afetado pelo conflito. O conjunto de práticas está regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na política nacional prevista na Resolução n. 225/2016, voltada a implementar a utilização de seus métodos no Judiciário.
“É um convite para toda a sociedade construir um novo paradigma de convivência social a partir das diretrizes da tolerância, do diálogo, do atendimento das necessidades, da reparação de danos, da construção das responsabilidades individuais, mas também de corresponsabilidades coletivas. Quando o ser humano baseia suas condutas no cuidado – de si, do outro e do meio ambiente onde vive – tende a causar menos danos”, diz o juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Marcelo Salmaso, membro do Comitê Gestor da Justiça Restaurativa do CNJ.
Reparar e prevenir o dano
O especialista explica que a Justiça Restaurativa trabalha com vários métodos de transformação do conflito, entre eles, o Círculo de Construção da Paz – que é a metodologia mais conhecida no Brasil. Salmaso cita o artigo 1º, da Resolução 225/2016, que traz o conceito de JR como um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos e ações que visam a conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais, e sociais motivadores do conflito e da violência.
“A proposta não é de passar a mão na cabeça de quem cometeu um crime, muito pelo contrário. Ela só tem lugar se a pessoa que praticou o fato danoso se conscientiza do que fez e dos seus efeitos, bem como se responsabiliza por tratá-los, o que é muito mais profundo e sofrido do que receber uma pena aplicada por um terceiro (juiz), sem gerar qualquer responsabilização quanto ao fato praticado. A pessoa paga a pena e continua replicando os mesmos danos, sem qualquer reflexão a respeito do que fez”, afirma a juíza federal do TRF3 (seção São Paulo) Kátia Heminia Lazarano Roncada, que também participa do Comitê Gestor da Justiça Restaurativa no CNJ.
A magistrada ressalta, no entanto, ainda haver muito desconhecimento dos operadores da Justiça em relação aos métodos restaurativos. “O diferente, o desconhecido, gera resistências. Há muitos campos a serem desbravados e muitas hipóteses de aplicação começam a ser vivenciadas com sucesso. Há excelente material de consulta, tanto em âmbito doutrinário, quanto de referência de boas práticas. Não há pressa, há convites e muitos novos voluntários estão se apresentando para esse trabalho de transformação”, defende a juíza.
Abordagem humanista
Para o coordenador do Comitê Gestor da Justiça Restaurativa no CNJ, ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, a Justiça Restaurativa abre portas para mudanças individuais e sociais. “Reparar e restaurar é o caminho filosófico que o direito deve seguir para que a sociedade, e também o Judiciário, possa encontrar meios de mudar a realidade das pessoas, através de oportunidades, novos caminhos e busca pela igualdade”.
No caso do conflito envolvendo a família paranaense, foram necessários seis meses e muitos encontros para se concluir um acordo considerado satisfatório tanto do ponto de vista jurídico como humano. O conflito foi acompanhado por vários órgãos da Justiça, entre eles a Justiça Federal (TRF4), a Advocacia Geral da União (AGU), a Defensoria Pública e o Centro de Justiça Restaurativa da Seção do Paraná (Cejure/PR).
A aplicação da metodologia em matérias criminais foi orientada pelas Nações Unidas e apontada pelo Manual sobre Justiça Restaurativa desenvolvido pelo Escritório das Nações Unidas contra o Crime (UNODC) como “uma resposta evoluída ao crime que respeita a dignidade e a igualdade das pessoas, gera compreensão e promove a harmonia social recuperando vítimas, infratores e comunidades”. O Manual, desenvolvido por organismos internacionais, está disponível no Portal do CNJ.
* Nome fictício em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente
Texto: Regina Bandeira
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias
The post Justiça Restaurativa: Judiciário aplica método em caso de subtração internacional de crianças appeared first on Portal CNJ.
Outras Notícias
Portal CNJ
Justiça do Trabalho do Ceará busca solucionar ações coletivas complexas
06 de dezembro de 2022
Uma iniciativa do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (TRT-7) para solucionar ações coletivas de maior...
Portal CNJ
Vara da Infância e Juventude de Sobral (CE) realiza audiências concentradas
06 de dezembro de 2022
A Vara Única da Infância e Juventude de Sobral realizou audiências concentradas para fazer a reavaliação...
Portal CNJ
Mulher que combateu trabalho escravo é aplaudida em Brasília após 30 anos
06 de dezembro de 2022
Pureza Lopes Loiola, cuja saga para encontrar o filho, em situação de trabalho escravo, foi contada nas telas de...
Portal CNJ
Justiça 4.0: sistema de gestão de bens garante controle na tramitação judicial
06 de dezembro de 2022
O Poder Judiciário já pode contar com uma nova ferramenta para gestão de bens judicializados. O Conselho Nacional...
Portal CNJ
Combate à violência de gênero ganha reforço com mulheres nos estádios
05 de dezembro de 2022
Somente a Copa do Mundo de 2022 chancelou a presença feminina nos estádios do Catar, abrindo caminho também para...